Lucrécia ficou linda, com uma beleza que todos admiravam. Certo dia, subiu com uma cadeira em uma pequena mesa para se olhar no espelho, mas no lugar dele estava uma pintura da Virgem, onde ouviu-a dizendo: “Como és boba! De que servem essas vaidades? Te basta ser bela na alma”.
Entre os irmãos mais velhos havia um, Domênico, que sabia como ganhar sua confiança de uma maneira especial. Ele gostava de pintar e passava parte do tempo trancado em seu estúdio, onde ninguém tinha entrada, exceto Lucrécia, onze anos mais jovem que ele. Ele se tornou seu confidente e também seu mestre de desenho. Esse pintor-eremita, que morreria em fama de santidade, indubitavelmente influenciou a orientação ascética da irmãzinha.
Aos treze anos, ingressou como educanda em um nobre mosteiro de San Martín, onde duas de suas irmãs já a haviam precedido. Sob a orientação das religiosas, ela adquiriu uma cuidadosa educação literária; se aperfeiçoou em bordados e outras habilidades femininas. Ao mesmo tempo, chamou a atenção de suas educadoras por sua profunda piedade, seu espírito de mortificação e sua ânsia em se retirar, bem como sua postura absorvida e séria.
Quando Lucrécia se despediu das irmãs, sua vocação já estava decidida. Mais tarde, ela própria mencionou o motivo de sua escolha para o distante mosteiro capuchinho de Città di Castello. Ainda como educanda, aproveitou a presença de um confessor extraordinário para explicar seus desejos por uma vida de ocultação e austeridade, em total pobreza. O religioso examinou o espírito da jovem e seus motivos. Então fez isso diante de seus pais. Aos comentários sobre o porquê daquele mosteiro distante, Lucrécia respondeu que era exatamente por esse motivo, preferira distanciar sua vida retirada de sua terra natal e família.
O impacto com o mosteiro fora mais duro do que o previsto, as Irmãs pareciam hostis e a Mestra, a futura Santa, Irmã Verônica Giuliani, dava a impressão de não querer recebê-la. Lucrécia conseguiu superar aquele terrível momento, porque sua vocação era autêntica. Em março de 1703, recebeu uma resposta afirmativa. E começaram os preparativos para a “viagem da esposa”. Era costume, então, que, antes de deixar o mundo para se retirar no mosteiro, a jovem candidata fizesse uma viagem, em um vestido de noiva, para se despedir de parentes e conhecidos e depois embarcar na jornada.
Chegando a Città di Castello, aguardou a admissão formal, que se realizou em 7 de junho de 1703, festa de Corpus Christi. A cerimônia presidida pelo bispo, que lhe impôs o nome de irmã Flórida, por devoção ao santo padroeiro da cidade, São Flórido. O ritual da vestição foi concluído com um gesto de significado eloquente: o bispo colocou no ombro da noviça uma cruz de madeira, e ela caminhou, ao longo da igreja, em direção à porta do mosteiro.
Santa Verônica Giuliani, mestra das noviças, descreveu em seu diário a luta interior que teve que sustentar, não se sentindo no auge de uma missão tão delicada. Jesus lhe prometeu: “Serei seu Mestre e o Mestre da noviça”. A Virgem Maria também veio em seu auxílio, dando-lhe a entender que era uma alma muito seleta: “Eu recomendo, Verônica, a minha ‘Floridina’, minha alegria e a alegria do meu divino Filho”.
A noviça seria muito em breve, não apenas sua melhor discípula, mas sua confidente… A harmonia entre a mestra e a noviça não foi difícil, principalmente quando irmã Verônica descobriu que a jovem era chamada para seguir o caminho da cruz, como ela. Sim, era difícil para a pequena condessa fazê-lo de maneira plena e espontânea, talvez nem sempre delicada, tradicional nas capuchinhas; mas não demorou muito para assimilar, contente em afastar os modos do ambiente em que crescera.
Irmã Flórida gostaria de abraçar com todo o rigor todas as observâncias conventuais, em particular o jejum perpétuo imposto pela Regra; mas, após vários testes, ele teve que se convencer de que essa não era a vontade de Deus: seu estômago não suportava tal rigor; por prescrição médica, ela era forçada a comer várias vezes ao dia.
Fez sua profissão em 10 de junho de 1704. Era a norma que as neoprofessas continuassem no noviciado por mais dois anos, ainda que com o véu preto, e colaborando com a outra mestra. Irmã Flórida pediu, por graça, para continuar com o véu branco, observando o silêncio como já havia feito no primeiro ano.
O quão significante foi para ela a direção de sua venerada mestra, temos seu próprio testemunho no processo de canonização da Santa Verônica: “era uma pedagogia requintadamente evangélica, centrada no fundamental”.
Em 1708, teve a amarga notícia da morte de seu amado pai, o conde Curzio Cevoli, seguido alguns dias depois por sua mãe, ambas repentinas.
Como professa, Irmã Flórida executou vários serviços à comunidade, até os mais humildes, como é o uso entre as clarissas: cozinha, lavanderia, enfermagem, etc. Em 5 de abril de 1716 irmã Verônica foi eleita abadessa; a comunidade elegeu Ir. Flórida, que tinha 31 anos na época, como vigária. No final do primeiro triênio, ambas foram reeleitas para os mesmos cargos; que foi repetido no final de cada triênio até a morte da irmã Verônica. Ela encontrou em sua vigária uma ajuda verdadeiramente preciosa. Irmã Flórida recebeu e respondeu as cartas que a alcançavam em grande número, pois Irmã Verônica estava proibida de se corresponder, senão ao bispo, ao confessor e à suas pobres clarissas.
Em 9 de julho de 1727, a morte terminou a peregrinação de amor e dor de Santa Verônica Giuliani. No dia 21 do mesmo mês, foi realizado um capítulo no qual Ir. Flórida foi eleita abadessa, aos 42 anos. A mesma não se sentia à altura de tamanha responsabilidade. Orando diante de uma imagem da Virgem que tinha em sua cela, parecia entender que a própria Virgem lhe assegurara que não seria eleita abadessa enquanto tivesse aquela imagem com ela. Ao expor essa sua esperança ao confessor, este lhe deu a ordem de levar essa imagem ao coro; foi assim que a Virgem Maria manteve sua palavra e ela foi escolhida. E ainda seria reeleita muitas vezes. Ela exerceu o ofício de abadessa por 25 anos e o de vigária por mais 20.
Madre Flórida deixou no mosteiro a memória de um rigor inflexível na maneira de orientar a comunidade, atento à pura observância da Regra e das Constituições, principalmente em relação à pobreza. Ela não estava satisfeita em manter o nível alcançado sob a direção de Santa Verônica, queria ir mais longe, contando com o fervor das irmãs e a confiança que depositaram nela quando a elegeram.
As irmãs que testemunharam a seu respeito no processo de beatificação, disseram: “Ela costumava repetir: ‘Jesus quer ser servido por nós e por todos à sua maneira, não à nossa maneira’. E também: ‘Pelo nosso bom Deus, tudo é pouco, o que é feito e o que é sofrido’”.
Em todos esses anos, a Irmã Flórida sentiu-se obrigada com uma dupla dívida com Santa Verônica. Acima de tudo, estava encarregada de promover a continuação do processo de canonização; já havia começado no mesmo ano de sua morte, 1727, o processo diocesano; durante o processo apostólico, com uma declaração longa e muito detalhada, a comunidade encontrou uma maneira de cobrir as despesas graças à ajuda de benfeitores, incluindo os irmãos da abadessa. Ela seguiu de perto todos os passos da Causa; a mesma tinha os selos e gravuras impressas da Venerável. Mas os procedimentos foram lentos e as despesas se multiplicaram. E irmã Flórida morreu sem que seu anseio fosse alcançado: a beatificação de Verônica não chegaria até 1804 e sua canonização em 1839.
A outra dívida para com sua reverente mestra era a fundação de um mosteiro de capuchinhas em Mercatello, na antiga casa dos Giuliani. Em 1753, a pedra fundamental foi lançada. Antes de morrer, em 1767, ela poderia ter o consolo de saber que o trabalho estava terminado e que faltava apenas a aprovação pontifical para levar a cabo a fundação. O mosteiro seria inaugurado seis anos depois, em 1773.