Mártir da Revolução Francesa. Religiosa da Segunda Ordem (1747-1794). A beatificação de Madre Josefina, de sua irmã e das companheiras, se deu aos 13 de junho de 1920 pelo Papa Bento XV.
Memória litúrgica: 22 de outubro
(Calendário Romano-Seráfico)
A Ordem de Santa Clara vem através dos séculos perfumando a Igreja com corajosos frutos de santidade. Corações enamorados pelo amor de Deus, os quais plenos do espírito dos Fundadores Francisco e Clara souberam imolar a Deus suas vidas no vergel de um fogo devorador, desejaram em todos os momentos de sua vida responder a vontade do Senhor com um Fiat generoso e desinteressado, vivendo extremamente fieis ao seu Evangelho. Enfim, almas heroicas, que não temeram nem mesmo a morte, para seguir as pegadas daquele que ofereceu primeiro sua vida para nossa salvação.
A segunda Ordem franciscana ou Ordem das Irmãs Pobres, é em sua vivência feminina, o resplendor fiel da primeira Ordem. Pois a primeira plantinha do Seráfico Pai, soube assimilar com maravilhosa precisão, os ideais da perfeição evangélica vividos pelo santo fundador.
A expansão da segunda Ordem vê-se de uma maneira prodigiosa. De tempo para tempo foi aumentando o número das consagradas na clausura seráfica. Existem Comunidades de Clarissas em todo o continente. E com a vida de oração e penitência realizam seu apostolado na sociedade.
Desde a promulgação do Papa Pio XII em 1950, com a Constituição Apostólica “Sponsa Christi”, em alguns mosteiros estabeleceram o ensino, passando a exercerem o apostolado missionário. Ficam assim as Clarissas da “retaguarda”, isto é, fora do mundo, atrás das grades; e outras na “vanguarda”, no apostolado se os mosteiros encontram-se em países de missões.
Seguem as Clarissas, pelo mundo, fundando mosteiros em todos os recantos, bem como o de Nossa Senhora da Unidade, no Líbano, a fim de se sacrificarem e orarem pela unidade dos cristãos. E o famoso Mosteiro de Sangmelina Camerúm, formado por religiosas indígenas, às quais rezam o ofício divuno no ritmo da música vivaz local, adaptando assim, a vida contemplativa clariana a alma africana.
Ademais, a santa fundadora, infundiu em suas filhas o espírito heróico no desejo do martírio; quando em 12220, soube do martírio dos cinco primeiros Frades franciscanos mortos em Marrocos suplicando ao Pai Francisco, que a deixasse ir para lá sofrer ela também o martírio, por amor a Jesus, com um grupo de companheiras. O Senhor, no entanto, não permitiu que o martírio das Clarissas fosse cruento, mas incruento, numa vida de sofrimentos cotidianos.
Não faltou às suas filhas futuras, porém, a auréola do tão desejado martírio. Em 1289, o TRIPOLI caiu em poder do Sudão do Egito e foram imoladas todas as religiosas da Comunidade, mártires da fé e da virgindade. Dois anos mais tarde a mesma sorte cai para outras setenta irmãs de outra Comunidade de Clarissas na Toleimada. Todas elas, seguindo o exemplo da Abadessa, mutilaram terrivelmente o rosto para pôr a salvo o tesouro da virgindade. Rosas incendiadas de amor divino e lírios de pureza transplantados ao jardim celestial.
Milhares e milhares de alma, de santidade anônima, não colocadas oficialmente no calendário da Igreja, mas que brilham na corte celeste com todos os santos. Quando transpormos um dia os umbrais da eternidade as descobriremos; e entre elas a Beata Josefina Leroux.
Na casa paterna
Existe no norte da França uma cidade histórica, Cambray, que tem a honra de ser um lugar autenticamente cristão, selando no amor de Deus as almas ali nascidas. Correndo ao tempo, irmãs de sangue e, muito mais, irmãs nos ideais, derramaram sangue para serem fiéis à fé. Vinham pois, estas meninas, assinaladas pelo Dedo de Deus, porque a divina providência lhes havia preparado a glória do martírio.
Os cônjuges Carlos José Leroux, comerciante de botão, e Maria Picavez, tiveram duas filhas: Ana Josefa, que nasceu em 23 de janeiro de 1747, e para a alegria do lar, dois anos depois, Ana Margarida.
Educadas pelos piedosos pais, os quais lhes ensinaram desde a mais tenra idade a ter um grande amor a Deus e a Virgem Santíssima, as duas irmãs viviam muito unidas. Dia após dia iam adquirindo mais afeição pelas virtudes. Mesmo com a pouca idade, já gostavam de praticar pequenas mortificações. Sem dúvida, o Senhor lhes inspirava estes anelos, como preparação ao sacrifício que anos mais tarde lhes reservava: o martírio de suas vidas.
As pequenas eram muito aplicadas ao estudo. Depois de haverem cumprido seus deveres do colégio e ajudado nos afazeres domésticos, entretinham-se com suas leituras prediletas. Ana Margarida sentia especial gosto pela Sagrada Escritura; Ana Josefa se entusiasmava com a vida dos santos. Em certa ocasião, Ana Josefa deixa por um momento o livro e, demonstrando uma viva emoção em seu semblante, diz com lágrimas à sua irmã:
– Quão belo será, Ana Margarida, dar a vida por Jesus!
– Mas é necessário ser valente para não temer os tormentos, não é verdade? – afirma Ana Margarida.
– Pois não sabes que Deus infunde esta força aos mártires e eles nada temem por que o Senhor lhes concede uma graça especial? – responde convicta Ana Josefa.
Se tão nobres pensamentos ocupam seus corações; à medida que crescem em idade, estes crescem também.
Os anos da adolescência e juventude prometem ser fecundos em fantasias. O coração, igual à rosa em botão, vai se abrindo. Agora há pois, que transformar estes sonhos em proveitosa realidade. Os jovens têm esperança, porque desafiam os acontecimentos da vida, encontrando alegria mesmo nas dificuldades que se lhes apresentam. O jovem bem arraigado com o seu ideal nada teme. É audaz, é valente e só deseja conquistar este ideal. A confiança posta em Deus e em si mesmo, o faz herói até nos maiores sacrifícios.
Ana Margarida e Ana Josefa possuem um temperamento valente. Sentem desejo de uma maior perfeição para suas almas e lutam por consegui-lo. Provavam da suavidade do amor celestial. Embriagadas por suas doçuras, as carícias terrenas causavam-lhes dissabores e desgostos. Um certo dia Ana Josefa diz a sua irmã:
-Tenho o pressentimento de que Deus me pede algo de extraordinário, heroico em minha vida.
-Já sei, vais tornar-te religiosa! E eu te invejo querida irmã. Mas hoje só posso dizer-te que me causas grande dor em me abandonares.
-Eu também sofro pensando na dolorosa separação daqueles que amo extremamente; porém, o Senhor exige de mim este sacrifício, que deve estar acima dos pais e irmãos.
E na flor da idade, aos 22 anos, Ana Josefa veste o hábito seráfico, a 10 de maio de 1769, com o nome de Irmã Josefina, no mosteiro de Santa Clara em Valenciannes. Feito o noviciado professou os votos perpétuos a 12 de maio de 1770 na Regra da Santa Clara aprovada pelo Papa Urbano IV.
Deus, todavia, pede mais uma oferta para os pais Leroux: a oferenda de outra filha. A morada dos Leroux ficaria deserta do amor filial, porém, a odorífera fragrância das vítimas que se imolariam pela fé e fidelidade a Cristo, o Esposo de suas almas, perfumariam a Igreja de Deus.
Ana Margarida ingressou no mesmo mosteiro de sua irmã Josefina, aos 21 anos de idade, recebendo o nome de Maria Escolástica e professando a 9 de agosto de 1775.
A revolução francesa
Não podemos deixar de escrever resumidamente este período de terror da história, durante a qual pertencia a este convento a Ir. Josefina e sua irmã.
Quando Luiz XVI subiu ao trono, a situação não era tão difícil, os reinados anteriores haviam levados a agricultura da França a decadência por ocasião das múltiplas guerras. Os ideais filosóficos “Enciclopedistas”, haviam impregnado o espírito publico. Os movimentos religiosos sofreram duro ataque. Luiz XVI viu-se obrigado a convocar os estados gerais: representantes do clero, nobreza e povo, com a declaração em 1789 da revolução francesa.
Em 1793, foram executados o Rei, a Rainha Maria Antonieta e outros tantos da nobreza… prevalecia o regime terrorista até a queda de Robes Pierre, que revoltado, acabou seus dias na guilhotina, assim como madame Rolan igualmente revolucionária que teve grande influencia na política, com esta célebre frase: “Ah, liberdade! Quantos crimes se cometem em seu nome!” Uma agitação de paixões se desencadeou. O povo enfurecido não se saciava de sangue… de vidas inocentes. A guilhotina não cessava de tragar a vida dos nobres, dos sacerdotes e religiosos…
A vida no convento das irmãs Leroux
O fim da beata Josefina estava firmemente vinculado com o de sua irmã, também referente ao martírio, como se verá.
A vida das Clarissas de Valenciannes, se desenvolvia, praticando sua peculiar missão: os fins para que foram fundadas. As clarissas com o incenso de suas preces, a mirra de suas penitências e a oferenda do ouro de seus corações em holocausto a Deus, procuravam sua própria santificação e a salvação do mundo. Ir. Josefina, agora como abadessa, experimenta já em seu coração, anelos de heroicidade em sua vida de profunda oração.
A Comunidade das Ursulinas exercia o apostolado pedagógico com a educação da juventude feminina. Madre Escolástica era professora de caligrafia e trabalhos manuais entre as pensionistas.
Naquela época revolucionária cada dia, amanhecia com presságios dolorosos.
Até que no ano de 1771, uma lei suprimia as Ordens Religiosas em nome dos direitos e dignidade dos homens.
Em Valenciannes suprimiram nove comunidade masculinas e onze femininas. Porém, os comissários nomeados pelo município, antes de tomarem quaisquer medida severas, interrogaram as religiosas. Elas com um protesto de fidelidade a sua vocação e à Igreja responderam unanimemente:
“DESEJAMOS MORRER EM NOSSO CONVENTO“.
Regresso da Madre Josefina ao século
Dolorosíssimo foi para Josefina o retorno ao (século) mundo. Abandonar seu amado claustro. Porém, para as almas virtuosas, o fiel cumprimento dos desígnios de Deus é seu alimento. Josefina despojada do habito, deve voltar para junto de seus familiares, mas com o coração firme nos ideais de sua entrega a Jesus.
As Ursulinas obrigadas a deixarem seu convento pedem abrigo às irmãs da Bélgica e em setembro de 1792, munidas legalmente de passaporte transferem-se para aquela comunidade. Josefina não resistiu a tentação e apesar dos perigos foi visitar sua irmã, a Madre Escolástica. Chegando ao mosteiro abraçou demoradamente a irmã e disse:
– Irmã minha, é muito duro para mim o estar no mundo. Vivo com desgosto e ate com repugnância da vida no século. Não poderia vós aceitar-me em vossa comunidade?
– Com muito gosto a aceitaríamos, Josefina, porém, considera os perigos que nos cercam… vês a situação. Espera que se resolva o problema da guerra…
– Eu nada temo, responde Josefina, meu amor é mais forte que a morte.
Voltou muito triste com a resposta negativa. Tinha que esperar… Isto já era um martírio. Mais uma vez colocou serenamente sua confiança em Deus e estava segura de que realizaria seus desejos.
Para esta alma enamorada do ideal de uma vida de abnegação e obediência, nada se iguala as alegrias e garantia que oferece a vida de comunidade.
Em março de 1795, caminha a marcha da guerra em favor das tropas austríacas. As Ursulinas no exílio regressaram então ao seu convento.
Ingresso na Ordem de Santa Brígida
Em novembro de 1793, ingressa Josefina, juntamente com duas irmãs da Ordem de Santa Brígida. As três reviverão os melhores dias de sua existência, renovando o fervor de sua entrada na Ordem. Todas foram dignas de receberem depois a palma do martírio.
A vida começava a reorganizar-se, mas sempre com o temor de represália da república.
Diante de tais temores, as pessoas que podiam, fugiam de Valenciannes. As ursulinas, porém, preferiram ficar. A experiência dizia que a cidade de Mous, não era um lugar seguro. Onde haveriam de ir?
A perseguição
Em setembro de 1794 o exercito francês apoderou-se de Valenciannes. Pouco tempo durou à Madre Josefina o gozo do claustro. As Ursulinas foram forçadas a deixarem o convento, indo umas para casa de amigos, outras para casa de familiares. Começaram novamente as perseguições e número crescente de vítimas à guilhotina.
A Madre Clotilde, falou à Comunidade:
– Minhas filhas queridas, é chegado o momento de prepararmos, pois que somos esposas de Jesus. E o mais belo na vida de uma esposa é a fidelidade e que prova daríamos dessa fidelidade, se não tivéssemos nada que sofrer por Ele? É fácil ama-Lo, servi-Lo, quando o caminho da virtude está semeado de rosas; porém, o peculiar de uma alma virtuosa e amante é, ama-Lo e servi-Lo, tanto nas rosas como nos espinhos, na prosperidade como na adversidade.
A estas palavras, responderam com lágrimas, a uma só voz as religiosas:
– Reverenda Madre, nós morreremos se for preciso.
As irmãs se refugiaram na casa de Bougnier . Apenas saíram do mosteiro foram detidas, Madre Josefina com tranquilidade e coragem diz ao comissário Bertrand e aos soldados:
– Vamos não é necessário tanta rispidez para prenderem uma indefesa mulher.
E com serenidade lhes ofereceu alguma coisa para comerem, seguindo depois à prisão. Seguiram-se as prisões do restante das irmãs e muitas outras pessoas. O próprio mosteiro serviu de cárcere para os prisioneiros. Os tormentos morais eram mais cruéis que os físicos e as privações que padeciam. Porém, entre estas pessoas haviam sacerdotes e religiosos, que longe de perderem a paz, sentiam grande alegria de padecer por causa de Cristo.
Providencialmente foram conservadas algumas cartas, enviadas da prisão por Madre Josefina, eis uns belos parágrafos:
– (…) Experimentamos tais gozos, que a pena não sabe transpor para o papel (…). Que temos feito nós, para merecermos este favor? Podem comparar-se os males que temos sofrido com as delicias inefáveis que o divino cordeiro prepara às suas esposas privilegiadas com a gloria do martírio? Filhas de Santa Úrsula e suas companheiras, como elas, vamos nós dentro em pouco dar nossa vida por amor a Jesus. As consolações que sentimos em vista desses dons inexplicáveis e que nos prova a força e a graça. Sem esta sucumbiríamos todos ao peso de nossas penas. (…) Cinco de nossas irmãs já foram à guilhotina. Não andavam, mas voavam em direção ao suplicio, mostravam um semblante alegre e sereno. Nós esperamos a mesma sorte. Estou certa de que não receberás esta carta antes de nossa morte. Não os esqueceremos quando estivermos na glória.
Como os primeiros mártires do cristianismo, estas virgens do século XVIII, com uma força sobrenatural, desejaram ardentemente o martírio.
Durante as sete semanas que passaram na prisão, Madre Josefina e Madre Escolástica com as demais irmãs, tinham como ocupação principal a preparação para morte. Praticavam exercícios de piedade e se confessavam com os sacerdotes que também estavam presos. Com alegria esperavam a sentença da morte.
Caminho do martírio
Às 9:30 horas da manhã do dia 23 de outubro, são chamadas a se apresentarem, três religiosas Ursulinas, entre elas a Madre Josefina. O Tribunal a acusa de haver emigrado contra as leis; porém, a verdadeira realidade e motivo era o de professar a fé Católica Apostólica Romana. Interpelada primeiro, Madre Clotilde respondeu com serenidade e prontidão:
– Como superiora do mosteiro, minhas religiosas estão obrigadas a obedecer-me. Viajamos a Mous com passaporte do município e depois recebemos ordens para voltar a Valenciannes. A culpa é minha de terem violado as leis, podeis condenar-me mas deixai as outras livres.
As religiosas se recusaram a abandonar sua Superiora. Por outro lado o Tribunal mostrava-se indulgente. Ir. Cordule Barre declarou:
– Se de fato, pelo que a Superiora fez deve morrer, morrerei também.
Quando foi dito que a Madre Josefina não havia emigrado nesse tempo, o juiz contestou: a senhora emigrou. E não houve apelo à sentença errada de tal juiz; e junto com as seis religiosas, inclusive a Madre Josefina, condenaram mais seis sacerdotes.
Com semblante alegre, pois que já esperavam por este momento, Madre Josefina e seus companheiros receberam a declaração que lhe condenava à guilhotina e que se efetuaria em poucos momentos. Voltaram à prisão. Cenas emocionantes foram registradas pelos presentes. Madre Josefina confortada com sagrada comunhão um dia antes, começou a marcha juntamente com os companheiros, rumo ao cadafalso, instalado na praça dos Valenciannes.
Estas seis virgens, anjos de modéstia, iam com passo firme e rápido, alegres e serenas, cantando belos cânticos.
O povo que presenciava tal cena admirava a intrepidez destas religiosas. Eis que iam ao encontro da glória… com suas vidas sugadas ganhavam o céu.
Dizia Josefina ao ver a guilhotina:
– Me sinto imensamente feliz por me ser concedido morrer pela fé católica. Se pode temer acaso o deixar a terra quando o pensamento está na felicidade do Paraíso.
Decapitaram primeiro a Superiora. Quando Josefina é chamada, vai ao encontro do verdugo e beija com grande amor sua mão, perdoando a todos os seus perseguidores; depois oferece resolutamente sua cabeça à guilhotina.
Assim morreu esta virgem degolada aos 47 anos de idade, juntamente com sua irmã, Madre Escolástica, e as quatro companheiras de martírio, aos 23 de outubro de 1794.
A beatificação de Madre Josefina, de sua irmã e das companheiras, se deu aos 13 de junho de 1920 pelo Papa Bento XV.
FONTES:
1- Las Clarisas a través de los siglos, Fr. Ignacio Omaechevarria, OFM
Tradução:
Ir. Benvenuta, OSC